A fotografia tem sido há muito uma favorita deste autor, e desde que escrevemos sobre ela em 2009, descobrimos através de Isaac Koi, que já em 1982 Loren Gross havia publicado em sua série “UFOs: A History” a origem correta da montagem: a edição de 1 de Abril de 1950 da foto-revista alemã “Neue Illustrierte”. Em 2003 Achim Martin
partilhou com Gross cópias do artigo original, infelizmente as
publicações de Gross têm circulação muito limitada e suas reprodução são
xerográficas. Decidi assim obter a edição original de “Neue Illustrierte”,
publicada em Colônia, Alemanha, e datada de 29 de março de 1950. Era
uma revista semanal, e como anunciado em uma chamada vermelha logo na
capa, cobria a data de 1 de abril.
Os Marcianos!
Ao abrir a revista, já na página 3 de Neue Illustrierte, o leitor descobre a fonte desta imagem icônica:
As legendas contam sobre como o disco voador foi capturado em uma
fotografia do sargento americano “D. Ussel”, sendo abatido logo depois.
Seres estranhos emergiram e “se moviam perdidos, planando estranhamente
sem impedimento, como mergulhadores sob a água”. O agente McKerenich
comenta como estava “Ciente da grandiosidade do momento, pela primeira
vez na história da Humanidade um terráqueo via um visitante do espaço!”.
O homem prateado estaria coberto por camadas de metal, que o
observatório de Phoenix especulava ser uma proteção contra radiação. Uma estranha escrita “marciana” é apresentada, e descrevendo a imagem
mais famosa, descobrimos “a grande surpresa: o marciano tem… apenas 70
centímetros de altura!”. Estas seriam “as únicas imagens verdadeiras, e o
leitor deve tomar cuidado com fraudes toscas circulando na imprensa
mundial”.
Sargento Otário
Como
é típico de brincadeiras de Primeiro de Abril, há várias pistas sobre a
piada, incluindo como foi criada. O sinal mais evidente já havia sido
notado por Koi: o sargento da divisão anti-aérea D. Ussel é uma
brincadeira com a palavra “Dussel”, que significa otário em alemão. O comentário sobre como as “figuras pareciam se mover perdidas,
planando estranhamente sem impedimento, como mergulhadores sob a água” é
uma referência às imagens correspondentes, que são em verdade de um
grupo de patinadores britânico, “The Lidstones”. Note como as poses são
características de apresentações artísticas desta natureza. O aviso final sobre “fraudes toscas” circulando na imprensa também é um ótimo toque. Todos estes sinais foram confirmados na próxima edição de Neue Illustrierte, publicada em 5 de abril de 1950. Na página 43, encontramos o aviso:
Neue Illustrierte, Colônia, Alemanha; 5 de abril de 1950; p. 43 |
Uma busca por patinadores chamados “The Lidstones” revela uma foto de Susan Miller de Joan e James Lidstone
publicada em 1962. O homem se assemelha ao marciano, embora não
possamos estar seguros da identificação devido à baixa qualidade de
ambas fontes:
Um ponto interessante é que as botas do marciano parecem botas de
patins. Embora na mais famosa das montagens o marciano esteja seminu,
nas outras duas as figuras humanóides parecem usar trajes colantes
prateados, incluindo toucas, e é possível que estes trajes tenham sido
usados pelos patinadores em alguma apresentação, poupando trabalho aos
autores da montagem. Já com relação ao disco voador, Martin Kottmeyer já havia identificado o objeto como “uma imagem retocada do modelo de disco do Dr. E.W. Kay que apareceu na imprensa em 11 de janeiro de 1950”:
Do Primeiro de Abril para a História
Devido à baixa qualidade das reproduções da imagem mais famosa,
também é notável que confusões surgiram a respeito da composição da
cena. Abaixo, destaquei em cores diferentes as cinco pessoas (incluindo o
marciano) que aparecem na montagem:
A interpretação mais comum, refletida no pequeno brinquedo japonês no
início deste texto, representa a mulher encarando a câmera (em amarelo)
com as pernas afastadas. Em verdade, na fotomontagem original pode-se
ver sua perna esquerda e perceber que a mulher está em verdade de lado, e
as pernas no lado direito da imagem pertencem à segunda mulher (em
vermelho). Ainda assim, esta é uma montagem com vários problemas: a mulher em
amarelo aparece na frente daquela em vermelho – sua mão direita a
obstrui – e, todavia, as pernas da mulher em vermelho estão claramente à
frente, uma delas em linha com o pequeno marciano. As duas mulheres
provavelmente não pertenciam, ao menos nessa geometria, à mesma cena, e
foram recortadas e coladas sem uma consideração apropriada ao seu
arranjo espacial. O autor da fotomontagem pode ter deixado tais
incoerência evidentes propositalmente, como parte da brincadeira. Várias outras confusões surgiram relacionadas à imagem, a mais comum associando-a à fraude de 1953 nos EUA envolvendo um macaco sem pêlos. O corpo do marciano alemão não é o de um macaco sem pêlos, a menos que se considere um ser humano dessa forma. Como mesmo Donald Keyhoe notou à época, o mote de pequenos extraterrestres de um disco acidentado derivou da Fraude de Aztec
– Roswell só retornaria à Ufologia no fim da década de 1970. A fraude
de Aztec também inspirou, exatamente na mesma época, e também na
Alemanha, a criação de outra famosa fotografia de um extraterrestre capturado. Através de Koi, tomei conhecimento do livro de Jenny Randles e Peter Hough “Looking for the Aliens” (1991). Ele cita o trabalho de Claus Westh-Henrichsen que indicava que “as
posições das mãos dos ‘homens de segurança’ sugere que estavam
segurando um objeto rígido. Depois de conduzir testes, ele propõe que
eles estavam empurrando um carrinho de bebê!”. Validando esta sugestão, criei mesmo uma montagem para ilustrar a hipótese,
mas ao verificar a imagem original em melhor qualidade e observar com
melhor clareza as posições das mãos dos homens, é preciso notar que a
menos que estes segurassem uma parte curva, suas mãos não estão
alinhadas. Da mesma fonte também havia considerado a informação de “Han-Werner Peiniger
de um grupo OVNI da Alemanha Ocidental de que esta foi outra
brincadeira de 1 de abril e que os autores eram G Falscht e R Logen, o
que em português é similar a Ds Mascarador e U Mafraude (de fato,
traduções literais de ‘forjado’ e ‘faz-de-conta’). Entretanto, ao
obter tanto a edição original da brincadeira quanto a seguinte com a
clarificação, não pude encontrar qualquer referência a “G Falscht e R Logen” como autores da história.
Escrita Marciana
Ao ler as pistas sobre uma “enigmática escrita marciana” publicada
pela revista, suspeitei que era uma mensagem em alemão, apenas invertida
e espelhada:
E, realmente, o amigo Manuel Borraz a decifrou (com algum esforço você também conseguirá lê-la):
“Die Erde gefällt uns nicht.
Wir möchten wieder nach Hause.”
Que significa:
“Não gostamos da Terra.
Queremos voltar para Casa.”
Esta foi uma excelente brincadeira de 1 de Abril, com todos os sinais
possíveis de ser uma fantasia, e que foi esclarecida como tal na edição
seguinte a qualquer leitor que ainda ficasse em dúvida. Todos
pesquisadores OVNI sérios ao longo dos anos descartaram a imagem como
uma fraude, embora os detalhes precisos tenham eludido a maior parte
deles por décadas, com confusões estendendo-se até hoje. Ao localizar e partilhar a publicação original, espero que o caso seja solucionado.
FONTE:www.ceticismoaberto.com
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